5 de outubro de 2009

Combate ao crime com tropa gera guerra na GNR

O comandante da GNR veio defender a entrada das Forças Armadas (FA) no combate ao crime. Mas a possível intromissão nas funções da Guarda está a levantar forte polémica dentro da instituição. Numa reunião de chefias, o homem-forte da GNR viu contestada a sua tese. E acabou por mandar um comunicado para todos a explicar o que defende.

As palavras do comandante-geral da GNR, em defesa da utilização do efectivo das Forças Armadas na luta contra a criminalidade, foram alvo de violentas críticas de oficiais superiores e dirigentes associativos da guarda. O general Nelson Santos viu-se mesmo obrigado a enviar uma nota a todo o dispositivo da guarda, para esclarecer a opinião que tinha defendido num encontro promovido pela revista Segurança e Defesa, na passada semana.

Enquanto a polémica se disseminou nos quartéis, porém, um outro alto dirigente da GNR, o general Carlos Henrique Chaves, comandante de Doutrina e Formação, voltou ao assunto, alertando para a necessidade de "consubstanciar, em termos legais, a colaboração" entre militares e polícias - o que, em termos práticos, implica uma alteração da Constituição da República.

A polémica, aliás, nasceu precisamente com o apelo de Nelson Santos aos responsáveis políticos, para que mudassem a Constituição de forma a permitir que os militares pudesse travar a criminalidade ao lado das forças de segurança. "A criminalidade não é um problema exclusivo das polícias e no seu combate devem ser empregues todos os meios que permitam ir vencendo as batalhas diárias, de forma a que a guerra global contra o crime nunca se perca, como infelizmente acontece noutras partes do mundo", declarou este alto responsável, que é também oficial do Exército.

O comandante-geral da GNR defendeu, na mesma conferência, que "terminaram os "tempos" em que a "criminalidade violenta" era uma "excepção". "Hoje, encontra-se claramente no topo das preocupações da sociedade" portuguesa, asseverou. "Importa que no nosso país olhemos o futuro com prudência e cautela, porque o crime e a violência continuarão a fazer parte do nosso quotidiano em dimensão, grau de incidência e configuração que são imprevisíveis", concluiu.

Críticas ao mais alto nível

Na GNR, esta intervenção, publicada no DN, causou controvérsia. Numa reunião, realizada poucos dias depois, com todos os comandantes do País, generais e coronéis, alguns dos oficiais superiores manifestaram-se contra a posição assumida por Nelson Santos. Este alegou que as suas palavras estavam inseridas num determinado contexto - e distribuiu aos seus oficiais cópias de todo o discurso que proferiu. Percebendo que a polémica podia alastrar, o general emitiu ainda um comunicado interno para todo o dispositivo da guarda, com um link remetendo para o site da GNR, onde está um ficheiro com o seu discurso.

A Associação de Profissionais da Guarda (APG), a mais representativa desta força, viu com muito maus olhos o que leu. O presidente José Manageiro considera "muito graves" as declarações do comandante. A APG considera que "responsabilizar as Forças Armadas pela actividade policial seria, no mínimo, militarizar a segurança interna do País, o que seguramente os militares não desejariam, por estarem vocacionados, como estão, para a defesa e contra a agressão de inimigo exterior. A missão das Forças Armadas é bem distinta da exercida contra prevaricadores de ordem e tranquilidades públicas", diz José Manageiro ao DN.

Em defesa do comandante-geral vem o responsável máximo da Doutrina e Formação da GNR, general Carlos Chaves, igualmente oficial do exército. Num artigo que vai ser publicado na revista do Instituto de Defesa Nacional, diz que é "por demais evidente a necessidade de, em termos legais, se consubstanciar a cooperação entre as Forças e Serviços de Segurança e as Forças Armadas, visando o "combate conjunto e/ou combinado nas respectivas missões, às designadas ameaças ou agressões de natureza transnacional".

Este oficial dá como exemplo o caso de França, onde existe "um Conselho de Defesa e Segurança Nacional, presidido pelo Presidente da República", no qual militares e polícias definem estratégias conjuntas. Do seu ponto de vista "é desejável que a Assembleia da República dedique a este assunto a maior atenção e cuidado.

Mas a polémica da participação das FA em missões de Segurança Interna também é política.

Com a nova legislatura, prestes a abrir, mandatada para rever a Constituição da República, até o actual ministro da Defesa, Severiano Teixeira, veio já sugerir que a entrega às Forças Armadas de missões de segurança fosse discutida na Assembleia. Os programas dos partidos ignoram a matéria, pelo que só nos próximos meses se descobrirá o final da história. (DN)

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