15 de outubro de 2009

Discurso do Almirante CEMA por ocasião da Abertura do Ano Operacional

Senhor Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna,
Senhor General Chefe da Casa Militar de Sua Excelência o Presidente da República,
Senhores Directores-Gerais,
Ilustres Convidados,
Senhor Almirante Vice-Chefe do Estado-Maior da Armada,
Senhores Almirantes e Senhores Generais,
Senhores oficiais, sargentos, praças, militarizados e civis da Marinha
Minhas Senhoras e meus Senhores,

As minhas primeiras palavras nesta cerimónia de abertura do ano operacional destinam-se a saudar e a incentivar os que se encontram em missão, ao serviço de Portugal. Saúdo particularmente os fuzileiros e o pessoal de saúde destacado no Afeganistão, e a guarnição da fragata “Álvares Cabral”, navio-chefe do Standing NATO Maritime Group 1, que está empenhada na Operação Active Endeavour, após o que seguirá para o Golfo de Áden para mais um empenhamento no âmbito do combate à pirataria. Seguidamente, quero agradecer a disponibilidade dos ilustres convidados para aqui estarem connosco. O meu muito obrigado pela Vossa presença. Bem vindos à Marinha.Esta cerimónia destina-se a dar público reconhecimento do trabalho efectuado por quem está na primeira linha de exigência operacional, constituindo uma oportunidade para fazer o balanço do trabalho efectuado pelos que no mar ou a partir do mar, dão o melhor do seu esforço e dedicação ao País.O produto operacional das unidades navais, de fuzileiros e de mergulhadores, da Autoridade Marítima Nacional e do Instituto Hidrográfico, são a razão de ser da Marinha. Com efeito, é ele que permite ao País usar o mar na justa medida dos seus interesses e das suas necessidades.De forma sóbria e discreta, normalmente para além dos olhares do cidadão comum e longe da atenção mediática, empenhamo-nos no cumprimento pronto e eficaz das missões, obtendo resultados que fortalecem a confiança dos portugueses na sua Marinha. De facto, os indicadores operacionais referidos pelo senhor Vice-Almirante Comandante Naval, no que concerne ao último ano, são gratificantes e motivadores, traduzindo bem o produto do investimento que é feito, como também o são os resultados da actividade desenvolvida pelos órgãos e serviços da Direcção-Geral de Marinha e do Comando-Geral da Polícia Marítima, validando de forma inequívoca o conceito da Marinha de Duplo Uso. Estes resultados são, também, a face visível do trabalho de todos os que diariamente superam dificuldades na manutenção e apoio da Esquadra, bem como os que asseguram que ela é guarnecida por pessoal preparado e treinado de acordo com os mais elevados padrões internacionais.A qualidade do nosso desempenho está ao nível das melhores marinhas, como tem sido evidenciado em rigorosos processos de treino e avaliação, e é continuamente comprovada, nomeadamente pela elevada taxa de sucesso no âmbito da busca e salvamento marítimo e, sobretudo, pelas operações, chamadas do mundo real, no exterior, como aquelas em que estivemos empenhados este ano.

Ilustres convidados,
Marinheiros,
O cumprimento da nossa missão sustenta-se em três paradigmas de transformação, que nos orientam nos domínios genético, estrutural e operacional. Esta é, também, a oportunidade ideal para fazer um balanço daquilo que de novo aconteceu em cada um destes três domínios e, a partir daí, tentar vislumbrar o que o futuro nos vai trazer.No domínio genético, em que o nosso modelo é o de uma “Marinha Equilibrada”, quero começar por abordar alguns aspectos relacionados com o pessoal, para depois passar à área do material.Como sabem, foi recentemente promulgado o novo regime remuneratório, o qual visa, no essencial, regular a transição de um regime baseado em escalões para outro baseado em posições e níveis remuneratórios. Nesse enquadramento, sei bem que o novo regime não traduz a justa aproximação das remunerações dos militares às das profissões de referência. Todavia, é forçoso registar que houve uma evolução, que em alguns casos é significativa, havendo agora que acautelar as regras de transição para que esta mudança não venha a defraudar adicionalmente as legítimas expectativas dos militares.No que diz respeito aos suplementos dos militares das Forças Armadas, que estão ainda a ser discutidos, preconizo um sistema de incentivos que se assuma como um instrumento de integração e de motivação e que reconheça a especificidade do pessoal embarcado e daquele que actua na primeira linha de exigência operacional. É nesse enquadramento que continuo, e continuarei, empenhado na justa revalorização dos suplementos aplicáveis aos militares da Marinha, no âmbito da revisão em curso.No que respeita ao material e à renovação da Esquadra, quero lembrar o que aqui referi há um ano atrás. Uma parte muito significativa das nossas tarefas é efectuada por patrulhas e corvetas que têm mais de 35 anos de serviço e não conseguirão manter, por muito mais tempo, os actuais níveis de emprego operacional, pese embora o grande esforço das suas guarnições.A situação dos patrulhas, em particular, torna imperiosa a sua substituição pelas futuras lanchas de fiscalização costeira, pelo que me congratulo com a assinatura, no passado dia 17 de Março, do contrato entre o Ministério da Defesa Nacional e os Estaleiros Navais de Viana do Castelo para a aquisição de cinco unidades, com opção de compra para mais três.As corvetas serão substituídas por navios de patrulha oceânica, estando previsto que as duas primeiras unidades, em construção em Viana do Castelo, sejam aumentadas ao efectivo dos navios da Armada durante o ano de 2010. Contudo, mantém-se a urgência na construção das outras seis unidades previstas, duas das quais vocacionadas para o combate à poluição e para a balizagem.Ainda no âmbito da regeneração da esquadra, congratulo-me com o aumento ao efectivo da primeira fragata adquirida à Marinha Holandesa, a “Bartolomeu Dias”, em 16 de Janeiro deste ano. Esta unidade naval, de inquestionável valor militar, permite-nos, desde já, estar disponíveis para assumir dois comandos de força naval em simultâneo. Teremos connosco, dentro de alguns meses, a “D. Francisco de Almeida”. Recebemos a “Diligente”, a terceira unidade da classe “Vigilante”, para reforçar o dispositivo do Instituto de Socorros a Náufragos, integralmente concebida e construída em Portugal, no Arsenal do Alfeite. Finalmente, a Esquadra irá em breve dispor dos dois novos submarinos: o “Tridente”, actualmente a efectuar provas de mar e que esperamos receber no próximo ano, e o “Arpão”, em 2011.Estaremos, como sempre, longe da turbulência que tem existido na opinião pública, com fins que não nos compete avaliar. Estamos, porém, certos que Portugal não pode ceder a outros a sua responsabilidade soberana e de intervenção nas zonas oceânicas do seu interesse estratégico, não podendo, por isso, dispensar a arma submarina, como, em devido tempo, e bem, foi reconhecido pelo poder político. Ter submarinos é caro, muito caro, mas muito mais caro seria não os ter em especial para as gerações que nos sucedem.Faço votos para que a miopia marítima que ciclicamente nos afecta e que nos últimos anos tem apresentado sintomas de recuperação não sofra uma recaída irreversível que retire a Portugal o seu maior potencial de desenvolvimento – o mar.Não menos importante, será a concretização do contrato de aquisição do navio “polivalente logístico”, o mais conjunto de todos os meios do nosso sistema de forças e um elemento essencial para assegurar a nossa capacidade expedicionária. Por fim, aguardamos a disponibilização das viaturas tácticas ligeiras blindadas que permitam a integração dos Fuzileiros na unidade de Force Protection do módulo de apoio às OMLTs no Afeganistão, prevista para o início de 2010.

Distintos convidados,
No domínio estrutural, o nosso paradigma é o de uma “Marinha Optimizada”, com uma organização capaz de maximizar a articulação dos seus meios, no âmbito das tarefas que o País necessita para usar o mar. Isto implica manter a sua estrutura em permanente evolução, adequando-a continuamente às necessidades e respeitando a sua inserção no âmbito das Forças Armadas e da Defesa Nacional. Como sabem, ficou concluída recentemente a Reorganização da Estrutura Superior da Defesa Nacional e das Forças Armadas, que se traduziu na revisão da Lei de Defesa Nacional, da Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas, conhecida como LOBOFA, e das Leis Orgânicas do MDN, do EMGFA e dos três ramos.No que respeita à Lei de Defesa Nacional e à LOBOFA, considero que, no essencial, foi respeitada a especificidade da Marinha, que decorre do ambiente em que actuamos e das tarefas que desempenhamos, algumas delas sem carácter marcadamente militar. Estão neste caso as seguintes missões cometidas à Marinha:• Exercer a autoridade marítima e garantir o cumprimento da lei nos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição nacional;• Assegurar o serviço de busca e salvamento marítimo nos espaços marítimos sob responsabilidade nacional;• Realizar operações e actividades no domínio das ciências e técnicas do mar.Estas tarefas exigem uma organização própria e integrada, a funcionar permanentemente no mar e em terra, que muito beneficiará das valências únicas existentes no Centro de Operações Marítimas: COMAR.No que respeita à Lei Orgânica da Marinha, a LOMAR, o anterior diploma esteve em vigor cerca de 16 anos e já não correspondia integralmente à actual realidade estrutural. A sua revisão, proporcionou a oportunidade para concretizar algumas alterações que visam optimizar a organização da Marinha. Citarei apenas três delas. A primeira diz respeito à inserção numa só estrutura dos elementos da componente operacional do Sistema de Forças dependentes do Comando Naval e dos que asseguram tarefas operacionais no âmbito do Instituto Hidrográfico, da Autoridade Marítima Nacional e do Serviço de Busca e Salvamento Marítimo. A segunda evolução decorre do reconhecimento da importância do recurso “informação” e traduziu-se na criação de um novo órgão central de administração e direcção com a missão de assegurar as actividades da Marinha no domínio da gestão da informação e da administração das tecnologias da informação: a Superintendência dos Serviços de Tecnologias da Informação.A terceira novidade traduziu-se na criação da Inspecção-Geral de Marinha, dando resposta à necessidade, há muito sentida, de possuir um serviço central de inspecção individualizado. Este novo órgão permitirá sedimentar o modelo de gestão estratégica da Marinha, pelo reforço da função “inspecção”. Ainda, no domínio estrutural, concretizou-se a empresarialização do Arsenal do Alfeite, medida da maior importância e impacto estratégico, que representa um novo desafio para a Marinha. Estou certo que, em estreita colaboração, saberemos encontrar as melhores soluções para que a Esquadra continue pronta.E, finalmente, após um longo processo que todos conhecemos, concentrou-se, como se impunha, a ETNA no Alfeite rentabilizando-se recursos.Os caminhos estão abertos para que as gerações que nos sucederem tenham condições para melhorar o muito que se fez com competência, dedicação e visão do futuro.

Ilustres convidados
No domínio operacional, o nosso paradigma é o de uma “Marinha de Duplo Uso”, pronta para realizar, simultaneamente, uma actuação militar no plano da defesa militar e do apoio à política externa, e uma actuação não militar, centrada na segurança e autoridade do Estado no mar e no apoio ao desenvolvimento económico, científico e cultural. A Marinha está ciente de que, face à complexidade do ambiente de segurança actual, só será possível dar resposta aos múltiplos desafios que se colocam no imenso mar português através de uma cooperação alargada entre as várias entidades que nele exercem responsabilidades. Esta premissa, tem-nos motivado para assumir uma postura de grande abertura e de incentivo à cooperação entre departamentos do Estado, designadamente no âmbito do Centro Nacional Coordenador Marítimo, fórum que tem permitido melhorar a articulação entre os diversos intervenientes, contribuindo decisivamente para a afirmação de Portugal nos espaços marítimos de sua responsabilidade.
É também com esse propósito que temos vindo a desenvolver a Iniciativa Mar Aberto, na qual procuramos pôr em prática um modelo de cooperação inovador, indo ao encontro das necessidades dos PALOP e de Timor-Leste, no ambiente marítimo. Esta iniciativa tem enquadrado, todos os anos, o empenhamento em África de uma unidade naval e de equipas multidisciplinares oriundas dos vários sectores da Marinha.É certo que não há desenvolvimento económico sem segurança, e o mar não é excepção. É para garantir isso que empenhamos, ao longo de todo o ano e vinte e quatro horas por dia, um conjunto significativo de meios da estrutura operacional. Nalguns casos estamos no limite máximo de exploração operacional, noutros poderemos fazer mais, muitíssimo mais.Estão neste caso os fuzileiros, cujas potencialidades estão, em minha opinião, desaproveitadas. Actualmente, o único empenhamento internacional dos fuzileiros decorre na reduzida participação no quadro das OMLT, no Afeganistão. Assim, descontando este pequeno envolvimento, desde 2006 que não se verifica o empenhamento de uma força ou unidade de fuzileiros no exterior. Isto significa que não se tem tirado partido dos nossos fuzileiros em apoio à política externa, apesar de estes estarem prontos, bem treinados e equipados, o que, a par das suas qualidades militares, seria o garante de uma participação visível e prestigiante. A este propósito, não será demais recordar que as nossas unidades operacionais são objecto dos maiores encómios sempre que lhes é granjeada a possibilidade de integrarem forças multinacionais, como foi o recente caso da “Álvares Cabral” e da “Corte Real”, que prestigiaram de forma bem marcada a Marinha e o País. Tal aconteceu também com a “Sagres”, que na sua habitual viagem de instrução se constituiu como uma plataforma multinacional e multicultural de troca de experiências para jovens militares das Marinhas amigas, oriundos de 3 continentes, e também com a “Baptista de Andrade”, empenhada na Iniciativa Mar Aberto – 2009, em Cabo verde.Outros excelentes exemplos do aproveitamento das capacidades residentes na Marinha ao serviço do País são as actividades diariamente executadas no âmbito da Autoridade Marítima Nacional, seja no combate à poluição, no salvamento marítimo, no assinalamento marítimo ou na repressão de ilícitos, bem como o empenhamento dos navios hidrográficos na campanha relativa à extensão da nossa plataforma continental, certamente um dos maiores trabalhos realizados no domínio da geografia dos oceanos. Desta campanha resultará um legado de potencial de desenvolvimento económico e científico para as gerações futuras, cuja importância e valor a sociedade portuguesa reconhecerá.

Marinheiros,
O orgulho por tudo aquilo que temos concretizado é um estímulo para enfrentarmos os desafios que se aproximam. Continuaremos atentos às evoluções do ambiente externo, nomeadamente à crescente importância das operações no litoral. Nesse enquadramento, vamos edificar uma força projectável que agregará capacidades no âmbito da vigilância e da protecção, numa base de polivalência e de complementaridade. Esta nova Unidade de Acção Litoral incluirá unidades navais, de fuzileiros e de mergulhadores, podendo ser complementada com forças policiais marítimas. O seu objectivo passará por dar resposta militar e não militar às ameaças de natureza assimétrica que caracterizam o presente e o futuro ambiente de segurança marítimo, em actuações à superfície, submarinas e na interface mar-terra. Esta unidade poderá complementar as capacidades existentes no âmbito da segurança interna, caso seja solicitado o recurso a meios militares. Adicionalmente, poderá ser disponibilizada no âmbito das organizações internacionais de que o País faz parte, indo assim ao encontro dos recentes desenvolvimentos relacionados com as Operações de Segurança Marítima. Temos ainda outros desafios importantes pela frente: o comando do Standing NATO Maritime Group 1, que exercemos com brilhantismo desde Janeiro deste ano e que se prolongará até ao fim de Janeiro do próximo ano, e o comando da EUROMARFOR, que assumimos em Setembro passado, por um período de 2 anos. São desafios em que vamos ter que continuar a demonstrar a qualidade e a dedicação a que habituámos o País, com uma marcada postura de serviço a Portugal e aos Portugueses.

Ilustres e distintos convidados,
Militares, militarizados e civis da Marinha
Tracei-vos uma breve avaliação do passado recente e das perspectivas futuras nos âmbitos genético, estrutural e operacional. Como Comandante da Marinha, estou profundamente orgulhoso do que conseguimos, sempre guiados pelo objectivo de permitir a Portugal usar o mar na justa medida dos seus interesses. Neste ano operacional, cujo início hoje marcamos, são muitos os desafios que temos pela frente. Há que continuar a trabalhar permanentemente no sentido de contribuir para o reforço da autoridade do Estado nas nossas águas jurisdicionais tirando o melhor partido dos navios de que dispomos, mesmo que, nalguns casos, desactualizados. Há que garantir importantes compromissos internacionais e há que integrar novos meios. Tudo isto numa conjuntura financeira que certamente será muito difícil. Saberemos responder com dedicação, brio e profissionalismo. Os resultados alcançados no ano operacional que agora se completa são o garante de que conseguiremos superar este e outros desafios. Como comandante, sinto-me orgulhoso do que tem sido feito em conjunto e, neste novo período que agora se inicia, conto com a minha guarnição, para que a Marinha possa continuar a honrar Portugal.
Muito obrigado
Fernando de Melo Gomes
Almirante

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