1 de novembro de 2010

"Nove séculos de sangue, suor e lágrimas"

Pela primeira vez, a História Naval de Portugal foi reunida num único volume. A Marinha edita a obra de José António Pereira.

Foi ainda nos tempos do Condado Portucalense que se registou o primeiro combate naval de que há memória registada na História de Portugal. Em 1121, as barcas armadas da regente do condado, D. Teresa, enfrentaram no rio Minho a frota das forças leais à sua irmã, D. Urraca, regente da Galiza.

Começa aqui a narrativa do livro ‘Marinha Portuguesa Nove Séculos de História’, da autoria do capitão-de-mar-e-guerra José António Pereira. O volume de mais de 600 páginas, editado pela Marinha Portuguesa, é o primeiro a traçar uma história dos feitos marítimos portugueses, desde o início da Nacionalidade até aos tempos actuais.

A PRIMEIRA BATALHA

Afonso Henriques, filho de D. Teresa e fundador do reino de Portugal, alargou pela espada o território nacional ao longo de todo o seu reinado. A tomada de Lisboa em 1147 dá ao País o seu primeiro grande porto marítimo, mas a guerra com os muçulmanos estava longe de acabar. Em 1179, o almirante mouro Gamin Bem Maradins ataca Lisboa e segue para norte, onde a sua frota conhece forte oposição das tropas comandadas por D. Fuas Roupinho. O contra-ataque surge meses depois e culmina com a grande batalha naval da História. Em 1180, a armada comandada por D. Fuas Roupinho desbarata os navios muçulmanos ao largo de Lisboa, naquela que ficou conhecida como a Batalha do Cabo Espichel.

É destes e muitos outros episódios de guerra, exploração marítima e comércio que se compõe o livro de José António Pereira, um trabalho de investigação que demorou sete anos a estar concluído: "A ideia surgiu em 2003, por iniciativa do então chefe do Estado-Maior da Armada, Francisco Vidal Abreu. Constatou-se que não havia nenhum texto que compilasse toda a história da Marinha e eu, que já tinha preparado um breve resumo de 30 páginas que usei nalgumas palestras que dei na Escola Naval, voluntariei-me para essa missão", conta o autor, que na altura era secretário da Comissão Cultural da Marinha.

O volume lançado na última quinta-feira inclui centenas de ilustrações, reproduções de pinturas, fotografias, mapas e infografias que explicam ao detalhe a história naval do País.

"Foi um trabalho profundo de investigação. Para se ter uma ideia, posso dizer-lhe que as imagens incluídas no livro são oriundas de 64 entidades, portuguesas e estrangeiras", explica José António Pereira.

CIÊNCIA NAVAL

A expansão marítima que os portugueses iniciaram no século XV é, obviamente, um dos temas em destaque no livro. "Aqui importa salientar a importância da caravela portuguesa, o navio dos Descobrimentos por excelência. Os marinheiros portugueses revolucionaram a ciência naval, ao conceber um navio que permitia navegar longe da costa de África, sobretudo nas viagens de regresso". As caravelas conseguiam navegar contra o vento e os enormes avanços alcançados na cartografia e na orientação pelos astros ficaram como legado de um povo que descobriu no mar a sua vocação.

BRAVURA DOS MARES

As grandes batalhas da história marítima são destacadas no livro e explicadas ao pormenor. O capitão-de-mar-e-guerra destaca, pela sua importância militar e histórica, a Batalha de Diu, que aconteceu em 1509. "Aconteceu aquilo que se designa em termos militares como uma batalha decisiva ou de aniquilamento. Após a vitória conseguida pelo primeiro vice-rei, D. Francisco de Almeida, Portugal dominou os mares da Índia sem qualquer oposição durante 30 anos. Foi uma vitória comparável à dos ingleses em Trafalgar".

Quando se lhe pergunta qual a figura mais marcante da história naval portuguesa, José António Pereira não hesita em eleger o rei D. João II: "Não tenho qualquer dúvidas em apontá-lo como o mais importante político da nossa História. Foi ele quem, no século XV, definiu o que seria a nossa política externa nos cinco séculos seguintes: a expansão para África e para o Oriente".

DECLÍNIO

"Como diz um famoso historiador inglês, um pequeno país só pode conservar um império se dominar uma ciência ou uma tecnologia. Foi o que aconteceu a Portugal na época dos Descobrimentos, mas quando perdemos o domínio da ciência naval para os holandeses e depois para os ingleses começou o declínio", diz José António Pereira.

Terminada a época das descobertas, a vocação marítima desvaneceu-se. O Brasil e depois a colonização de África, no século XIX, foram as últimas tentativas de manter a presença portuguesa no Mundo. No início do século XX, a frota mercante portuguesa estava muito enfraquecida: "As duas guerras mundiais mostraram a nossa vulnerabilidade e dependência de terceiros para garantir o abastecimento do País". Uma realidade que mudou aquando da Guerra Colonial, altura em que o País "tinha uma marinha mercante e de guerra pujantes, que assegurou a logística em três frentes de combate", defende José António Pereira.

Depois veio o declínio. O autor explica que "o transporte ferroviário e, sobretudo, o rodoviário ultrapassaram o transporte marítimo", condenado a marinha mercante e ao quase desaparecimento. José António Pereira, que já foi capitão do Porto de Aveiro, acredita que a aposta no mar – tão defendida pelo actual Presidente da República – é uma aposta de futuro.

O actual director do Museu de Marinha sublinha, na actualidade, o brilhante desempenho dos militares nas missões internacionais que têm cumprido: "Já provámos que, se nos derem condições, podemos ser tão bons ou melhores do que os outros".

PERFIL

José António Pereira, capitão-de-mar-e-guerra e director do Museu de Marinha desde 2006, tem 62 anos. Escreveu várias obras sobre a História Naval.(Correio da Manhã)

2 comentários:

  1. Uma desgraça, o actual "presidente da república" ter acordado tão tarde para este tema. Da sua triste passagem pelo governo, recordamos perfeitamente as malfeitorias exercidas contra as actividades marítimas, entre as quais, as pescas e a indústria de conservas. As 3 Meko não servem de desculpa para a hecatombe generalizada.

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  2. Caro Nuno Castelo Branco,
    os presidentes da república andam sempre navegar à vista e do voto. Uma vergonha, estou farto desta República !

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