Os alemães da Ferrostaal podiam legitimamente incluir negócios já em curso de empresas portuguesas no conjunto das contrapartidas para a economia nacional a que se comprometeram na sequência da vitória no concurso de venda a Portugal de dois submarinos.
Esta foi a principal conclusão do Tribunal que julgou o processo relativo às contrapartidas do contrato dos submarinos e que ditou a absolvição dos dez arguidos no processo, acusados pelo Ministério Público (MP) de crimes de falsificação e burla ao Estado - acusação que foi considerada totalmente desprovida de fundamento.
O Ministério Público adiantou, logo no dia da leitura da sentença, há uma semana, que vai recorrer.
Em causa, recorde-se, estão os contratos de compra dos submarinos e das correspondentes contrapartidas para a economia nacional, assinados entre o consórcio alemão GSC e o Estado, em 21 de Abril de 2004: Portugal comprou o Arpão e o Tridente ao GSC, por mil milhões de euros, e este consórcio comprometeu-se a arranjar 1.200 milhões de euros de negócios à indústria nacional. No fundo, seria um meio de voltar a injectar na economia parte do dinheiro gasto na aquisição dos submarinos.
Processo era 'desnecessário'
Em 30 de Setembro de 2009, o MP, através do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), deduziu acusação contra três arguidos alemães - Horst Weretecki, vice-presidente da Ferrostaal (que liderava o consórcio GSC), Winfried Hotten (director no departamento Naval da Ferrostaal) e Antjie Malinowski (técnica adjunta) - e sete portugueses, ligados à indústria de componentes automóveis: José Ramalho (da Simoldes Plásticos), Filipe Moutinho (Sunviauto), António Roquette e Rui Moura santos (Inapal Plásticos), Jorge Gonçalves (Amorim Industrial Solutions), António Jacinto (Ipetex) e José Medeiros (Comportest).
De entre os 1.200 milhões de contrapartidas previstas, cerca de 227 milhões referem-se a 16 projectos no sector automóvel. Desses, segundo o MP, sete projectos no valor global de cerca de 76,4 milhões de euros são contratos e negócios anteriores à entrada em cena da Ferrostaal e ao contrato dos submarinos. Analisando milhares de documentos (entre contratos, actas, facturas, cartas e e-mails), o MP concluiu, por isso, que aqueles empresários portugueses se associaram aos alemães para apresentarem ao Estado projectos e negócios que já decorriam, como se fossem novos e arranjados pela Ferrostaal. Em troca, as empresas teriam recebido uma comissão por isso. O montante global da burla e do prejuízo para o Estado foi estimado pelo MP em 34 milhões de euros.
Ao longo das 642 páginas do acórdão, os juízes da 6.ª Vara Criminal de Lisboa, Maria Judite Fonseca (presidente do colectivo), Flávia Macedo e Hugo Campanella, fundamentam a decisão, qualificando mesmo o processo instruído pelo DCIAP como “desnecessário e desproporcional”: não há provas de que os arguidos se associaram num plano criminoso, os documentos apresentados à Comissão Permanente das Contrapartidas (a CPC, encarregada de as validar) não contêm dados falsos, não houve qualquer vantagem patrimonial para os arguidos nem prejuízo para o Estado.
E se há de facto contrapartidas por concretizar - estão por executar, segundo dados oficiais, cerca de 600 milhões -, isso não deve ser levado para os tribunais. “Não se pode reconduzir todas as situações de incumprimento contratual à tipificação do crime de burla (…) No caso concreto, a acção penal é desnecessária e até desproporcional aos interesses em colisão, os quais podem ser salvaguardados com recurso a outros instrumentos”, salientam os juízes, apontando a negociação e os tribunais arbitrais como alternativas. ( Fonte: Jornal Sol)
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