19 de março de 2015

O barulhento bombardeiro Tupolev Tu-95

Quando cruzou os céus pela primeira vez, no começo da década de 50, o enorme avião Tupolev Tu-95 era o maior símbolo do poderio militar soviético. Até seu apelido, "Urso", fazia referência a seu tamanho e sua força.

Suas hélices pareciam antiquadas diante dos olhos ocidentais, que já viviam uma era revolucionária no design de aviões, com a tecnologia de motores a jacto.

Poucas pessoas acreditariam que, quase 60 anos depois, o avião ainda estaria na linha de frente da aviação russa, actuando como um bombardeiro estratégico ou fazendo o patrulhamento de longo alcance

Outra função do Tu-95, curiosamente, é servir como um avião "espião", ainda que seja o mais barulhento do mundo nessa categoria. Em Fevereiro, o TU-95 foi destaque no noticiários mundiais, depois que dois deles foram detectados perto do espaço aéreo da Grã-Bretanha e escoltados por caças da Força Aérea britânica.

A manobra era uma patrulha comum que os TU-95 faziam no auge da Guerra Fria e que recentemente a Rússia retomou. Mas a história de porque a Rússia ainda confia nessa máquina é mais interessante do que parece.

O TU-95 continua no activo, em parte, por causa de seu visionário criador. Andrei Tupolev era o principal designer de grandes aviões da antiga União Soviética, um engenheiro superdotado que foi preso durante o regime de Stalin por causa de acusações forjadas.

Com o fim da 2ª Guerra Mundial e o início da Guerra Fria com os Estados Unidos, Tupolev ajudou a criar o primeiro bombardeiro nuclear soviético, o Tu-4.

Tratava-se de uma cópia do Boeing B-29 Superfortress, o avião que lançou as duas bombas atómicas sobre o Japão. Muitas dessas aeronaves caíram em território soviético durante a campanha americana contra os japoneses, e os soviéticos conseguiram montar sua réplica com base em engenharia reversa.

Apesar disso, o Tu-4 não tinha alcance para chegar aos Estados Unidos a partir das bases soviéticas. Em 1952, Tupolev e outro importante designer aeronáutico da época, Vladimir Myasishchev, receberam a encomenda de projectar um bombardeiro capaz de carregar 11 toneladas de ogivas por 8 mil quilómetros, o suficiente para atingir o coração do território americano.

Enquanto o seu concorrente apostou em um projecto ousado, Tupolev decidiu misturar alguma tecnologias já testadas e aprovadas com ideias que surgiram com a primeira geração de jactos. "Foi uma abordagem vista como menos arriscada do que a concepção de Myasishchev", explica Douglas Barrie, analista de aviação do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, uma think-tank com sede na Grã-Bretanha.

O Tu-95 é uma aeronave gigantesca: tem 46 metros de comprimento e 50 metros de envergadura. Vazio, o avião pesa 90 toneladas e é movido por quatro enormes turbo hélices. O TU-95 tem oito conjuntos de hélices. Toda essa força é suficiente para fazê-lo alcançar mais de 800 km/h, velocidade quase semelhante à atingida por jactos comerciais modernos.

Diferente da maioria dos aviões a hélice, as asas do Tu-95 apontam para trás em um ângulo de 35 graus, um pouco como os primeiros caças a serem produzidos. Isso ajudou a aeronave a diminuir o arrasto e alcançar alta velocidade.

Os motores de Tupolev propulsionam dois conjuntos de lâminas com 5,5 metros de comprimento que giram em direcções opostas. Isso torna as hélices mais eficientes mas também cria um ruído ensurdecedor. Tanto que o Tu-95 é considerado o avião mais barulhento ainda em serviço no mundo ─ dizem que até submarinos americanos conseguem "ouvi-los" com seus sonares debaixo de água.

A função original do TU-95 "Bear" de lançar bombas nucleares sobre território inimigo acabou perdendo seu valor com o amadurecimento da tecnologia de mísseis. Mas seu design inteligente permitiu que o avião fosse adaptado várias vezes de acordo com seu uso.

Os Tu-95s de patrulha marítima sobrevoavam navios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) durante a Guerra Fria. Alguns deles até foram deslocados para Cuba, voando ao longo da costa americana a partir de bases no Árctico.

Outros TU-95, que foram adaptados para carregar mísseis de cruzeiro de longo alcance, já que tinham capacidade para levar uma carga tão pesada.

Ambições nucleares

Uma versão bastante modificada nasceu tempos depois, o Tu-126, que se tornou a primeira plataforma de vigilância aérea da União Soviética, actuando com um radar voador que alertava defesas sobre a aproximação de aeronaves inimigas.

O TU-95 ganhou até uma versão para a aviação civil, que até hoje mantém o recorde mundial de velocidade para um avião Turbo Hélice: 870 km/h, marcados em 1960.

Foi um Tu-95 modificado que lançou o mais potente explosivo, a bomba nuclear "Tsar ", testada pelos soviéticos em 1961.

A tripulação escolhida a dedo disparou a ogiva de 50 Mega toneladas sobre a ilha de Nova Zemlia, no Oceano Árctico. A bomba precisou de um para-quedas para dar tempo de a aeronave se afastar para uma área segura.

A força da explosão – dez vezes superior à de todos os explosivos detonados em toda a 2ª Guerra Mundial – fez o avião avançar mais de um quilómetro, apesar de estar a 45 quilómetros de distância.

Os soviéticos também estudaram a ideia de ter um "BEAR" movido a energia nuclear. O Tu-95 LAL foi equipado com um reactor pequeno e funcionou como um avião de provas. Acabou sendo retirado nos anos 60, apesar de ter conseguido provar que a tecnologia era viável.

Dos mais de 500 TU-95 construídos desde a década de 50, acredita-se que pelo menos 55 deles ainda estão a serviço da Força Aérea russa, enquanto vários modelos para patrulhamento marítimo fazem parte das frotas das Marinhas da Rússia e da Índia.

Assim como o B-52, da Força Aérea americana, o TU-95 se tornou praticamente insubstituível. Com actualizações e versões adaptadas, o grande "Urso" da Guerra Fria deve permanecer nos céus ainda por algumas décadas. Andrei Tupolev ficaria orgulhoso. (BBC Brasil)

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