29 de março de 2010

Afeganistão: Os custos militares da não participação

por MIGUEL SILVA MACHADO (Tenente-coronel pára-quedista na reserva)

Alguns defendem a não participação nacional na missão da NATO no Afeganistão. É uma posição legítima mas também tem custos para o País. Além da falta de solidariedade para com os aliados - nunca se sabe quando necessitaremos do seu apoio (até os EUA receberam apoio da NATO na sequência do furacão Katrina) -, as Forças Armadas Portuguesas ficariam mais debilitadas. Quem não esteja familiarizado com a "coisa militar" pode pensar: se não são empregues, cuidam do material, logo ficam mais fortes. Não é assim, mas ao contrário.

Sendo apenas uma das componentes da sua missão, talvez mesmo a mais nobre, mas não a mais exigente em termos operacionais, o apoio de carácter humanitário foi há dias cruelmente testado. O que diriam os contribuintes se depois da catástrofe que se abateu sobre a Madeira os pilotos dos C-130 não tivessem voado para o Funchal? Se a fragata Corte-Real não tivesse em escassas horas largado para o Atlântico? Se o Exército na Região Autónoma tivesse permanecido no quartel? Quando os meios e homens "funcionam" ninguém se admira. E bem, é isso que se espera dos militares e dos seus materiais. Que funcionem.

Mas não se pense que basta comprar uns navios, viaturas ou helicópteros e, em caso de necessidade, utilizar.

Alguém questiona o investimento feito nos helicópteros EH--101 e nos seus tripulantes quando salvam pessoas em perigo? Mas sabem quantas horas de voo têm de ser cumpridas para manter as tripulações qualificadas? Não há boas vontades que se sobreponham ao treino e ao subsequente emprego real. E quando é a sério é que se aprende!

Um navio da Marinha e a sua guarnição - um poderoso e complexo sistema de armas - para serem operacionais têm de navegar nas mais diferentes condições. Permanecer atracados no Alfeite, por mais que estudem e leiam manuais, não é suficiente.

Um batalhão do Exército para ser empregue em missões internacionais tem de preencher uma série de requisitos prévios nada compatíveis com improvisação. Isso aconteceu em conflitos anteriores e com os resultados que se sabem. E, também aqui, mesmo com treino e equipamento nada se sobrepõe ao seu emprego real.

Do ponto de vista militar, "técnico", os principais custos da não participação são a completa desadequação das forças em relação à realidade operacional actual. Mais ainda num teatro e operações como o Afeganistão, em que a introdução constante de novos sistemas de armas e de equipamentos de comando e controlo "obrigam" a essa evolução.

A participação portuguesa em missões exteriores veio trazer um grande manancial de conhecimento a parte dos quadros, mas interrupções neste ciclo podem criar uma perigosa ilusão, a de que estamos preparados. Há quem chame a isto a "síndroma da missão única": um militar participa numa missão e julga que as outras serão todas iguais.

Acresce, no caso nacional, o mau hábito de só adquirir determinados equipamentos depois de eles fazerem, reiteradamente, muita falta. Ou por desconfiança/ / ignorância do poder político em relação às propostas militares; ou por falta de previsão dos militares que não avaliam bem as lições aprendidas pelos aliados e mesmo pelos seus homens que andam com as "botas no chão". É uma realidade que se repete.

As Forças Armadas só servirão o País se estiverem dotadas de equipamentos modernos e dispuserem de militares treinados, motivados e experimentados. Desiludam-se os que acreditam que isto se consegue com a rotina de quartel ou em desfiles! Isto só se alcança com a participação em operações reais. A não participação em missões só conduz à ineficiência, logo à irrelevância externa e à desnecessidade interna.

As Forças Armadas são empenhadas na defesa do interesse nacional - e as opções são naturalmente definidas pelo poder político - mas também é do interesse nacional ter forças treinadas e equipadas para serem capazes de cumprir com sucesso as missões atribuídas. (DN)

1 comentário:

  1. Boa tarde,

    Isto é, obviamente, conversa de militar. Enquanto que a nobre ideia de ajudar os membros da NATO serve de bom propósito de treino por um lado, pelo outro ajudamos a manter a confusão no Médio Oriente a custo do contribuinte. Decisão esta completamente alheia ao povo Português, nas mãos do corrupto poder político...

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