31 de outubro de 2011

Fragata D. Fernando II e Glória "Um tesouro perdido em Cacilhas"

Durante o século XIX, a fragata D. Fernando II e Glória percorreu as águas dos oceanos Atlântico e Índico. Foi a última nau portuguesa da carreira da Índia e o derradeiro vestígio do império português naquele país. Hoje, dois séculos depois, é um museu e descansa em Cacilhas. Milhares de pessoas passam ali todos os dias. Mas poucos reparam nela.

Para assinalar o 196.º aniversário do nascimento do rei D. Fernando II, a Marinha Portuguesa abriu ontem as portas da embarcação. O alemão Fernando de Sax Coburgo tornou-se rei de Portugal a partir de 1836 quando casou com a rainha D. Maria II, cujo nome próprio era Maria da Glória. Construída em 1843, em Damão, na Índia, a fragata – nome dado a um navio com capacidade de guerra - foi baptizada em homenagem ao casal real.

«Durante 33 anos, o navio fez a ligação entre Portugal e a Índia, além de comissões em Angola e Moçambique. Cada viagem à Índia durava quatro meses», explica Rocha e Abreu, capitão de mar-e-guerra e comandante da D. Fernando II e Glória desde 2007. A nau (só navegava à vela) percorreu mais de cem mil milhas náuticas, o equivalente a cinco voltas ao Mundo.

Da destruição à restauração
Em 1889, passou a servir como Escola de Artilharia Naval e cumpriu um papel de ensino até 1963. Até que ficou quase destruída.

«Uma soldadura mal feita provocou um incêndio enorme. O navio ardeu e ficou encalhado no rio Tejo até 1992», conta Rocha e Abreu.

O Arsenal do Alfeite e os estaleiros Rio-Marine de Aveiro demoraram cinco anos a reconstruir a embarcação. Custou 12 milhões de euros e a D. Fernando II e Glória regressou aos mares como museu na Expo 98. Foi restaurada tal como foi construída, apenas com velas e sem motor auxiliar. Só navega a reboque.

«Colocar-lhe um motor auxiliar seria desvirtuar o navio. Até seria possível navegar só com as velas, mas era preciso uma guarnição de 150 homens», explica o comandante.

A partir de 2008, a D. Fernando II e Glória passou a estar em Cacilhas, junto ao terminal fluvial. Milhares de pessoas passam ali todos os dias rumo a Lisboa, mas poucas reparam numa embarcação de 86 metros de fora a fora. O último vestígio do império português na Índia.

«Seria impossível ter este navio a ocupar uma doca seca em Lisboa durante tanto tempo. Estas docas estavam inutilizadas e a Marinha assinou um protocolo com a Câmara Municipal de Almada. A autarquia está satisfeita em ter este pólo cultural no concelho», salienta Rocha e Abreu. O comandante recusa a ideia da pouca visibilidade da fragata em Cacilhas.

«A maioria das pessoas repara no navio e, ao fim de algum tempo, a curiosidade leva-as a visitar a D. Fernando II e Glória. E os restaurantes da zona beneficiam com isso», sublinha Rocha e Abreu.

Um sábado diferente
Com as portas abertas – a visita custa três euros – o museu recebeu dezenas de visitantes este sábado de manhã. Além de comandante, Rocha e Abreu é relações públicas, guia e historiador do navio.

Ontem, liderou as visitas guiadas pelo convés e bateria da fragata. Ao todo, a fragata tem 44 canhões, 22 em cima e outros tantos em baixo. Cada canhão pesa 1700 quilos e eram precisos oito homens para cada um. A D. Fernando II e Glória pesa 1849 toneladas. Só para fazer a suspensão da âncora eram precisos 82 homens...

Rocha e Abreu mostrou tudo. Os aposentos do comandante, a messe dos oficiais, o paiol da pólvora, a ‘burra’ - nome dado ao cofre do comandante onde era guardado todo o dinheiro -, a enfermaria e a roda do leme, feita de teca, uma madeira utilizada na Índia. Para manobrar a roda do leme eram precisos quatro homens. Para colorir o navio, foram colocados alguns manequins de cera, com roupas iguais às do século XIX.

«Às vezes estou no meu gabinete e os visitantes confundem-me com os bonecos de cera. Quando me mexo assustam-se. Até já faço de propósito», sorri o comandante da D. Fernando II e Glória. (A Bola)

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