12 de fevereiro de 2016

General José Pinheiro "As Forças Armadas deixaram de ser opção para os jovens"

A poucos dias de concluir o mandato como chefe militar, general José Pinheiro assume que a Força Aérea existe para fazer a guerra. Mas, tendo capacidades para apoiar as autoridades civis, é categórico: "Faça-se e faça-se muito"

Que balanço faz do seu mandato à frente da Força Aérea?

Foi complexo. Tivemos de ter capacidade para reagir a uma situação orçamental muito difícil. Passaram cinco anos e a Força Aérea Portuguesa [FAP] continua a voar, a operar e em segurança, a ser equilibrada, com capacidades... a FAP ou voa ou não existe. Perante as dificuldades orçamentais, que obrigaram a tirar pilotos do voo, tivemos de usar todas as opções para continuar a cumprir as missões em segurança. Isso é algo não negociável.

Uma centena de pilotos inscreveu--se na associação de oficiais...

Não me preocupa quem se inscreve na AOFA. Para me dizerem as preocupações que têm não precisam de ir para a AOFA...

Como entendeu esse movimento?

Um acto individual, não como um sentimento de revolta. Sou o primeiro a ficar preocupado com o que fazemos. A minha preocupação fundamental é que o que faço, o que determino que se faça seja feito em segurança. Nunca dei autorização para se voar sem condições de segurança adequadas e isso é algo que, a determinada altura, foi dito... nunca! Nunca ninguém me confrontou a dizer "não temos condições de segurança para fazer esta missão".

Nem na esquadra dos aviões de transporte C-130?

Não! Acha razoável mandar alguém para o ar assumindo que não tem condições de segurança? Agora pode não haver condições de segurança ideais e temos de adoptar os procedimentos adequados, como é o caso do C-130. O C-130 tem todas as condições de segurança, não pode é voar para certos sítios e certas altitudes. Indo para o ar, têm condições de segurança. Cumprimos as missões e somos muito bons, fazemos muito bem. O programa de alienação do F-16 à Roménia é um exemplo de competência.

Como é que está a decorrer?

Muitíssimo bem. Estamos a ajudar uma Força Aérea aliada a adquirir uma capacidade completamente nova, a formar pilotos, mecânicos... é criar uma coisa de raiz. É a FAP que o está a fazer e foram outros que entenderam que era a que estava em melhores condições para isso.

A reposição salarial vai desequilibrar as despesas na FAP?

É mais prudente, enquanto não tiver o orçamento atribuído, não fazer comentários. Em termos de despesas, a FAP gastou em 2015 cerca de 61% com pessoal, 10% com operação e 29% em apoio e investimento. Em 2011, com as dificuldades orçamentais, fizemos um plano de contingência até 2018 para ver onde se podia fazer economias, recentrar investimentos no sentido de assumir algum impacto da redução das horas de voo. Tivemos um corte drástico nas horas de voo em 2012, foi o número mais baixo de sempre... em 2010 fizemos 23 mil horas e em 2012 fizemos 15 mil. Isso teve consequências graves, algumas públicas, como ter menos disponibilidade para qualificar pilotos.

A missão na Madeira foi afectada...

Apenas retirei o piloto comandante, o helicóptero passou a ter um tempo de resposta mais alongado. A situação está estabilizada. A segunda tripulação nos Açores não, pois ainda não conseguimos gerar o número de pilotos comandantes para ter um dispositivo normal das tripulações do EH101. Procuramos qualificar os pilotos o mais depressa possível, mas demora tempo porque isso faz-se com horas de voo.

A FAP tem dificuldades de recrutamento?

Temos em algumas especialidades. Notamos diminuição no número de candidaturas e menos apetência para algumas especialidades. As Forças Armadas também deixaram de ser uma opção a considerar quando os jovens acabavam o ano escolar... os ciclos de recrutamento passaram a ser no fim do ano, por causa do controlo de efectivos e financeiro. Temos de encontrar um mecanismo para que, aos olhos das pessoas, servir nas Forças Armadas seja tão prestigiante como quem cá está sente que é. Temos de desmistificar que não se faz nada, não servimos para nada... fazemos muito e todos os dias. É evidente que as Forças Armadas não existem para buscar doentes, mas para a guerra. Mas se temos a capacidade de fazer, faça--se e faça-se muito. Quando vou buscar alguém estou a treinar...

A queda do preço dos combustíveis ajudou a voar mais...

Tem facilitado. Temos conseguido comprar mais combustível e aumentar as horas de voo. A FAP é um ramo muito focado na missão, nas horas de voo, nas qualificações dos pilotos, dos mecânicos, do pessoal de apoio... a margem de erro é muito pequena porque o erro paga-se caro. O erro pode repercutir-se daqui a algum tempo de forma dramática.

Como há anos, com o avião de instrução T37...

É verdade, daí a importância de termos hoje a Autoridade Aeronáutica Nacional e um gabinete de aero navegabilidade, responsável por assegurar que os meios aéreos militares têm garantia de aero navegabilidade e de formação dos mecânicos.

Como vê a FAP no médio prazo?

Tem de continuar a operar de forma bastante eficiente, tem de continuar a investir na qualidade da formação das pessoas, na qualidade e na prontidão dos meios, com capacidade para reagir a contingências... mas vejo uma FAP com ameaças, nomeadamente a atrição de pessoas e não estou só a falar de pilotos.

É melhor modernizar o C-130 ou esperar pela nova aeronave?

Os projectos de modernização e de substituição não são incompatíveis, são complementares. A modernização até pode facilitar a alienação dos C-130, porque os torna mais valiosos. Há um processo de muito curto prazo inscrito na Lei de Programação Militar (LPM)...

Há muitos anos...

É verdade, mas agora existe intenção de implementar a modernização. Precisamos de aumentar a flexibilidade de uso do C-130.

A modernização dará mais quantos anos de vida útil aos C-130?

Estamos a projectar para dez anos, no máximo.

A retracção da presença americana nas Lajes vai afectar a FAP?

No que respeita às operações, evacuações, transportes, transportes médicos, não tenho razão para estar preocupado porque a cooperação e as equipas que os norte-americanos tinham está garantida.

O novo aeroporto de Lisboa é compatível com a base do Montijo e o Campo de Tiro de Alcochete (CTA)?

Poderá ser. Agora, no âmbito deste processo Portela+1, a questão do CTA não foi analisada. É difícil compatibilizar as duas coisas numa zona restrita. Mas temos de ver como.

Foi à apresentação do Montepio Militar. É um sinal de descrença no regime de Assistência na Doença dos Militares (ADM)?

De todo. A ADM é fundamental, é algo em que acredito. Porque é que o CEMFA estava lá? Curiosidade. A ADM e o IASFA não me parecem substituíveis, como os vejo hoje. (Fonte: DN)

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