Navegar num navio militar em alto mar não é para todos. Requer conhecimento da disciplina, cumprimento das normas, tolerância em relação ao outro, resistência ao enjoo e respeito das regras que o mar impõe.
O navio da República Portuguesa Almirante Gago Coutinho tem cerca de 68 metros de comprimento. Tem autonomia de combustível para 84 dias a navegar a 10 nós, ou seja, a menos de 20 km/h, a velocidade máxima que pode atingir.Transporta comida para alimentar 35 elementos ao longo de 30 dias. Tem quatro geradores que geram energia dia e noite. E tem capacidade de produzir, por dia, 20 mil litros de água doce. Pode ser bebida, mas todos preferem água engarrafada. Aliás, um dos pedidos que é feito aos civis logo no início é que tenham alguma contenção no uso da água canalizada, de modo a evitar cortes no abastecimento.
A orientação dentro do navio, para quem chega pela primeira vez, não é fácil. Os corredores e as portas parecem todos iguais. Aos poucos cada um começa a usar o que consegue como referência. Um papel cor-de-laranja está na porta que abre para umas escadas que dão acesso ao piso superior. Decorar isso pode ser uma ajuda para chegar ao camarote. Leram bem, camarote. Aqui não há quartos, há camarotes. Os dos praças, os dos sargentos e os dos oficiais. De baixo para cima. Só o cientista chefe e seis oficiais têm direito a cama individual. Todos os outros dormem em beliches de duas camas. E, acreditem, subir e descer do beliche é tarefa que requer alguma perícia, força de braços e coragem.
O navio “Almirante Gago Coutinho” foi construído nos Estados Unidos da América e foi lançado à água em Janeiro de 1985, com outro nome (USNS - United States Navy Ship - “Assurance”).
“Construído como navio de vigilância e detecção submarina, enquanto esteve ao serviço da Marinha americana, tinha por principal tarefa a recolha de informação acústica em áreas oceânicas localizadas nas rotas dos submarinos da frota soviética, utilizando um sistema de hidrofones rebocados”, lê-se num “folheto de integração” escrito pelo actual comandante, o Capitão‐de‐fragata EH Luís Miguel Bessa Pacheco. Desactivado em 1995, o navio foi transferido para a Marinha Portuguesa em 30 de Setembro de 1999. Voltou à actividade operacional em 2007, já como hidrográfico. Esta alteração determina a história presente da embarcação. É, da Marinha portuguesa, aquela que mais navega (à excepção da Sagres). Está sempre a ser requisitada para missões científicas, como aquela que decorre nas Selvagens até ao final do mês de Junho, organizada pela Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental.
O homem que inventou o sextante
Carlos Viegas Gago Coutinho (1869/1959) foi oficial da Marinha, navegador, historiador e geógrafo. Ao serviço da Marinha Portuguesa, percorreu os quatro cantos do mundo. Produziu uma vasta obra de investigação científica. Publicou trabalhos geográficos e históricos , principalmente acerca das navegações portuguesas. Fez a travessia da África. Juntou-se a Sacadura Cabral e, em 1921, participou na atravessia aérea Lisboa‐Funchal e ainda, em 1922, a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, durante a qual se fez navegação aérea com grande rigor, utilizando o sextante. Um instrumento de navegação que Gago Coutinho inventou.
Normas a bordo
Resultam, sobretudo, da experiência e são fundamentais para evitar desastres irreparáveis.
Muitos marinheiros fumam, mas apenas o podem fazer no exterior do navio e não em todos os espaços e em todos os momentos.
Por razões de segurança pessoal, só se pode circular a bordo com calçado robusto. Nada de chinelos ou “havaianas”. O navio está cheio de escadas e, por vezes, há água e óleos no chão o que ajuda a escorregar. É preciso proteger o pé também de um eventual aquecimento do chão em caso de incêndio.
O navio tem uma pequena loja, que aqui se chama cantina, que abre mais ou menos uma hora por dia. O tabaco aqui é muito mais barato, mas só o pessoal da Marinha é que o pode comprar. Não podem ser passadas facturas de quaisquer despesas feitas a bordo.
A lista de curiosidades, aparentemente simples, continua. Aos poucos começamos a estar familiarizados com este mundo. E até expressões como “experiências de sereia” passam a fazer sentido, mesmo quando só querem dizer: sinais sonoros que dão a outras embarcações indicações de manobras com o navio. E nem sequer sabemos se ainda há sereias no mar... (Sic)
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